Estado civil: confuso
Cheguei a uma constatação que não sei como lidar com ela ainda.
Na última década, período em que me tornei adulto, finalmente, desenvolvi pensamentos a respeito dos meus relacionamentos pessoais: como conduzi-los, que expectativas ter, até onde chegar etc. Dentre estes pensamentos, sempre esteve muito claro para mim que, talvez, eu me tornasse um solteirão. Especialmente após uma meia dúzia de namoros fracassados, culminando com o fato de eu ter saído da casa da minha mãe para morar sozinho.
Acabei me acostumando à solteirice, pontilhada aqui e ali por outros relacionamentos fadados ao fim precoce. Tornei-me independente financeiramente, egoísta e responsável pela minha própria manutenção, mesmo em questões muito práticas, como limpar a casa, fazer compras e cozinhar. Sei que sou capaz de viver assim e, na maioria das vezes que aconteceu de eu expressar algum pensamento do tipo “preciso me casar”, no fundo, bem no fundinho eu não acreditava nessa possibilidade e talvez nem a quisesse. Quem não gosta de ser solteiro, de poder ter quem bem lhe prouver na cama, de sair sem explicar nada a ninguém? Quem não gosta de morar sozinho e poder beber suco direto da caixa, morder o pedaço de queijo em vez de cortar, deixar acumular toda a louça do armário suja dentro da pia, para lavar apenas duas ou três vezes na semana? Quem não gosta de trocar o jantar por um pacote de batata chips sabor peito de peru defumado?
Mas eis que, nos últimos (quase) cinco meses, estou em um relacionamento. Sim, um relacionamento em que se fala de casamento, ou pelo menos de moramos juntos. E sim, bem la no fundinho sempre com aquela descrença na constituição de uma família. E para ajudar ou piorar, eis que nos últimos dois dias, meu namorado caiu doente e eu assumi parcialmente o papel de cuidador dele.
Vejam a minha confusão: estou realmente sentindo prazer em fazer trabalhos domésticos. Prazer em lavar a louça para preparar a comida, prazer em cozinhar (vá lá, um cheese burger salad não é um banquete de cinco pratos), prazer em tê-lo em minha casa e cuidar de lavar as roupas dele, prazer em descascar e cortar uma manga em pedaços que ele possa comer. Antes disso, prazer em ir ao mercado e escolher as comidas que ele pode comer.
Quem sou eu?
Uma pessoa que é tão egoísta quanto eu me julgava não sentiria prazer em trabalhar para o bem estar do outro. Quem gosta tanto de não cozinhar, não lavar louça, não limpar a casa, seria impossível gostar de deixar tudo arrumado para uma outra pessoa. É ridiculamente estranha essa sensação de não ser eu quem está ali, preparando a medicação de outra pessoa. E ao mesmo tempo é muito prazeroso sentir-me responsável por outra pessoa além de mim mesmo.
Não sei mais o que eu espero dos meus relacionamentos. Não sei nem se terei outros relacionamentos; confesso que quero muito que este seja meu último namoro e que, na sequência, venha meu primeiro e único casamento na vida. Sou mais romântico e menos pós-moderno do que eu pensava, talvez. E concluo o texto com a reiteração da primeira frase escrita: não sei como lidar com isso.